sexta-feira, 28 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde


 Azulejos 

Charles Francis Annesley Voysey (Yorkshire,1857-Winchester, 1941) 

Pó de pedra e esmaltes/ calibragem

Inglaterra, Pilkington's Tile & Pottery Co. Ltd., ca. 1900

Quão profundo pode ser o VERDE? Imenso, por esta amostra dificilmente chega ao fim. E que frescura emana das diversas intensidades do verde usado nestes azulejos de desenho estilizado. Representam túlipas, de linhas depuradas, inscritas num fundo dividido por secções de diferentes matizes da mesma cor. De formas elegantes, curvas suaves e subtis tonalidades, atestam o triunfo do design que dispensa os excessos, de cores e de traços.  

A adoção da prensagem (calibragem) no fabrico de azulejos de pó de pedra, a partir de 1840, veio permitir a sua massificação. Em primeiro lugar, a utilização da pasta de pó de pedra, menos húmida, trazia benefícios. Encurtava em dias o tempo de secagem necessário antes da cozedura, aumentava a sua resistência permitindo reduzir a espessura e diminuía o risco de empeno no forno. Quanto à prensagem, ou calibragem, uma das suas grandes vantagens era servir de base a várias técnicas decorativas o que simplificava o processo de fabrico. Por exemplo no caso da decoração em baixo relevo destes azulejos, era possível realizar numa única operação, o processo de decoração da face nobre e o de corte dos azulejos. Esta particularidade tornava-os mais acessíveis o que impulsionou a sua difusão, especialmente nos azulejos Arte Nova, datados das últimas décadas do século 19 e até cerca de 1914, o início da primeira Guerra Mundial. O método implicava a compactação mecânica da pasta, por meio de um torno, sobre uma matriz de metal com o motivo do desenho inciso. Os desníveis da superfície, menos acentuados nas zonas interiores e fundos junto às linhas em relevo do contorno do desenho, originavam zonas de claro e escuro resultantes da maior ou menor acumulação dos esmaltes translúcidos e coloridos, aplicados posteriormente sobre a chacota. Sendo essa a razão dos belíssimos efeitos de gradação de cor deste tipo de azulejos, cujos esmaltes à base de chumbo serão posteriormente abandonados devido à sua alta toxicidade, perversa para a saúde dos operários. 

Uma das empresas que mais se destaca neste tipo de revestimentos cerâmicos é a Pilkington’s Tile & Pottery Company, localizada perto de Manchester. A sua produção começa em 1893, e rapidamente se desenvolve tornando-se líder de mercado em 1900. Contava com um administrador especializado em química de vidrados e, para além dos seus próprios artistas, recorria a afamados designers externos como Lewis Foreman Day (1845-1910), Walter Crane (1845-1915) e Charles Francis Annesley Voysey.  É precisamente este último o responsável pela criação deste padrão de túlipas e de muitos outros com motivos estilizados, designadamente pássaros, flores e folhas, produzidos de modo idêntico e revestidos de vidrados de cores translúcidas. Charles Francis Annesley Voysey foi um dos arquitetos e designers, mais originais e influentes do seu tempo. Nasceu em Yorkshire em 1857 e após um período de formação com o arquiteto John Pollard Seddon (1827-1906), estabelece-se por conta própria a partir de 1882. Desenvolve os seus primeiros trabalhos na área do desenho têxtil e de papel de parede concebendo padrões atrativos e inovadores. Recorre à natureza como fonte de inspiração, não copia, mas interpreta-a e dá asas à imaginação. Usa a estilização e a abstração para alcançar grandes efeitos decorativos. Revelando um enorme talento, foi chamado a colaborar com as mais destacadas empresas de tecidos, tapetes, papel de parede e azulejos.  Desenhou também mobiliário, artigos de mesa, talheres, objetos de metal, de iluminação e ferragens. Foi um dos primeiros a perceber a importância e o impacto do desenho industrial. No âmbito da arquitetura distinguiu-se através dos seus notáveis projetos de casas de campo, caracterizados pela elegância, linhas sóbrias e geométricas, de cores claras, bem construídas, usando bons materiais, para as quais desenhava os mínimos detalhes, evidenciando um conceito inovador para a época. Não era adepto de revivalismos, privilegiava os materiais à decoração. O seu estilo minimalista, de interiores pouco decorados, mas cuidadosamente projetados e mobilados, enquadram-no nos princípios do movimento Arts and Crafts e tornam-no um percursor dos ideais Modernistas. Participava regularmente nas exposições da Royal Academy, apresentando perspetivas aguareladas de moradias por si projetadas, e na Arts And Crafts Exhibition Society, de Londres, exibindo as suas criações de mobília, padrões decorativos, objetos domésticos e fotografias das suas casas.

segunda-feira, 24 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde


Travessa

Manuel Cipriano Gomes “O Mafra”

(Mafra,1831 – Caldas da Rainha,1905)

Faiança

Portugal, Caldas da Rainha, 1870-1897


Quem deixou entrar este lagarto VERDE! O facto é que ele entrou mesmo e ficou imóvel tentando passar despercebido em cima da travessa de folhas da mesma cor! Nunca mais o conseguimos afugentar.

É realmente realista a representação deste lagarto sobre uma cama de folhas de figueira. Trata-se de uma travessa decorativa de formato oval e côncavo, com o bordo recortado e pega castanha simulando o ramo da figueira. É realizada em faiança moldada revestida por belos esmaltes em tons de verde, castanho e subtis apontamentos de azul e amarelo.

Dentro da intensa representação da fauna e da flora usada por Manuel Mafra, os pratos e as travessas simples no formato de folhas já eram comuns na sua produção inicial, claramente inspirada na cerâmica inglesa. Preferia as folhas de hera, de videira, de louro, de sobreiro e de couve, perfeitamente modeladas e simplesmente vidradas numa belíssima cor verde. No tocante aos répteis e anfíbios, de produção posterior, entre cobras, salamandras e rãs, dominam os lagartos e os sardões, representados a verde e castanho, pontualmente manchados de azul e amarelo.

Este exemplar representativo da louça da Caldas da Rainha, foi executado precisamente pelo referido Manuel Mafra, ceramista inovador responsável pela introdução deste tipo de decoração naturalista na cerâmica da região. Manuel Cipriano Gomes, o “Mafra” nasceu a 30 de agosto de 1831 no lugar do Sobreiro, freguesia de Santo André, em Mafra. Era filho de um oleiro, com quem se iniciou nas artes do barro e tinha cerca de 20 anos quando se mudou para as Caldas da Rainha. Não demorou a ser integrado na olaria de Maria dos Cacos, a mais ativa à época, na produção de cerâmica utilitária, vendida nas feiras e que se distingue pelas características artísticas de alguns dos seus modelos, como vasilhame diverso, castiçais, garrafas, paliteiros em forma de mulheres, homens ou animais. Desde logo Manuel, chamado “o Mafra” pela sua terra natal, destaca-se como o mais hábil dos operários, acabando por adquirir a oficina, em 1853. Inicia então uma fase de inovação, alargando a policromia tradicional, adotando novos e mais elaborados modelos, optando por decorações relevadas com motivos da fauna e da flora, introduzindo novas técnicas decorativas como os areados e musgados que enriquecem e tornam única a sua produção.

Em 1860, Manuel Mafra abre uma nova oficina a “Fábrica de Louça de Caldas”, onde trabalharam, para além do próprio, vários familiares e outros operários, produzindo loiça manufaturada, artesanal, de grande apuro técnico, decoração exuberante e original. Gozou da proteção do rei consorte D. Fernando II (1816-1885), grande apreciador da cerâmica caldense e que lhe adquiria peças desde os tempos de Maria dos Cacos. Este reconhecimento garantiu-lhe clientela abastada. Proporcionou-lhe também a convivência com artistas e colecionadores, o contacto com as coleções reais, o que lhe apurou o gosto e a sensibilidade para uma estética Romântica, naturalista, inspirada no estilo de Bernard Palissy (1510-1590). Este ceramista francês, do século 16, célebre pelas suas peças moldadas a partir dos próprios animais, representava repteis, batráquios e peixes no seu ambiente natural; foi recuperado no século 19, período eclético caraterizado pelos múltiplos revivalismos. O Neopalissismo será uma dessas vertentes, seguida por sucessivos artistas franceses e ingleses, fortemente difundida e apreciada nas feiras internacionais, onde a partir de 1867 Manuel Mafra participa regularmente e cujas peças, de qualidade reconhecida, são elogiadas e por diversas vezes premiadas, entre 1871 e 1879.

Manuel Mafra será o primeiro ceramista das Caldas a marcar as suas peças e a partir de 1870, perante a quantidade de aquisições de D. Fernando, é autorizado a usar a designação de Fornecedor da Casa Real, sinal de qualidade e prestígio que lhe permite ostentar com orgulho a coroa na sua marca. No entanto, a partir da década de 80, motivos vários ditam a decadência da fábrica. São eles a morte do seu real patrono, em 1885, a ascensão do genial ceramista Rafael Bordalo Pinheiro estabelecido nas Caldas, a falta de um continuador à altura, a idade avançada e, ainda, a natural evolução dos gostos e a busca de novos modelos. A situação agrava-se quando deixa a direção, em 1887, acabando por encerrar definitivamente em 1897, alguns anos antes da sua morte, ocorrida a 12 de dezembro de 1905.

sábado, 22 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde

 

Figuras de Presépio

Barro policromado, cartão e madeira

Portugal, Madeira, século 19


Nem só de rezas vivia o convento. O Convento de Santa Clara, a mais antiga casa religiosa feminina da Madeira, sempre gozou de um estatuto à parte. Foi fundado por João Gonçalves da Câmara, 2º Capitão da donataria do Funchal, para acolher as suas filhas, bem como meninas e senhoras das mais abastadas e fidalgas famílias madeirenses. Uma das condições de entrada passava pelo pagamento de um avultado dote, numerário ou terras, o que facilitou o acumular de riqueza e permitiu ao Convento tornar-se em pouco tempo um dos maiores proprietários da ilha. Tal facto refletiu-se na vida conventual e as religiosas, que já tinham um estatuto superior aos das suas congéneres, acabaram por gozar de uma vida mais confortável, menos austera, algumas até com direito a serviçal para seu serviço. Mas não eram só as noviças que entravam, aos poucos o Convento tornou-se um centro de educação da elite feminina, naturalmente das que pretendiam professar os votos, mas também das destinadas a casar, cujas famílias as queriam mais preparadas e formadas. Era sinal de distinção ser educada no convento de Santa Clara, onde para além da adequada formação religiosa, aprendiam escrita, caligrafia, leitura, contas, música, bordados e doçaria. Também viúvas, órfãs e outras senhoras piedosas, mediante autorização especial, tinham acesso ao Convento para retiros por períodos mais ao menos prolongados. No século 18 e 19 esta tendência aumenta, assim como se tornam mais frequentes as visitas, nos locutórios, onde as freiras, atrás das grades, recebiam os visitantes, oferecendo bebidas, doces e produtos da sua lavra, como flores de cera e de penas, que também vendiam.

Apesar de sujeitas à obediência das orientações espirituais dos franciscanos e ao voto de clausura, os conventos de Clarissas tiveram um papel relevante na formação de comunidades vivas e atuantes onde haveria certamente momentos descontraídos de convívio e de expressão musical e artística. Será provavelmente um desses momentos que estas pequenas figuras retratam, não uma visita de estranhos no locutório, mas um convívio entre religiosos, onde o ato de receber incluía a oferta de comes e bebes, mas também algum entretenimento com a demonstração dos dotes artísticos destas religiosas especialistas em cânticos e recitais.

É dos meados do século 19 este conjunto de figuras de presépio realizado em barro, modelado e policromado, com assentos de madeira e cartão pintados num vistoso tom de verde. As Irmãs Clarissas vestem-se conforme a Regra, com o hábito preto, símbolo de sobriedade e de humildade, cingido à cintura por cordão, uma touca branca cobrindo a cabeça e o pescoço, emoldurando o rosto, e um véu negro, o que atesta não se tratarem de noviças. O frade de tonsura, usa túnica escura, cordão à cintura e segura um copo na mão esquerda. Partilha o canapé com a religiosa que apresenta a garrafa de bebida, enquanto as outras duas freiras sentadas, cada qual na sua cadeira, mantêm-se de livro nas mãos. Não se mostram aqui, mas completam este peculiar conjunto duas outras personagens tocando cordofones, sentadas em cadeiras amarelas. São elas um frade de hábito franciscano idêntico ao anterior e uma senhora de vistosas luvas verdes.

Nos presépios antigos e tradicionais, as cenas profanas da vida comum de todos os dias conviviam pacífica e alegremente, com os conjuntos de figuras religiosas que relatavam os episódios do nascimento e vida de Jesus, segundo um programa didático e evangelizador. Ao longo dos séculos 18 e 19 multiplicam-se os pastores nas suas diferentes lides e as personagens nos seus ofícios. Nos conventos, locais onde o culto do nascimento do Menino é particularmente ardente, os presépios multiplicam-se, naturalmente espelhando as respetivas vivências. Cabia a cada religiosa aprimorar o seu e esse papel era assumido como um sinal da sua particular devoção. Esta mistura entre o sagrado e o profano era importante e cumpria o objetivo consciente de permitir a todos a identificação e o reconhecimento da sua realidade quotidiana para melhor facilitar o entendimento e a assimilação da mensagem da Natividade. 

sexta-feira, 21 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde

 

Rio-Frio, Madeira

Litografia impressa a preto, colorida a aguarela.

Johan Christian Thornam, desenhador (dinamarquês, 1822-1908)

Johann Adolphe Kittendorff, litógrafo (dinamarquês, 1820-1902)

Copenhaga, 1852


Que agradável é “piquenicar” no Ribeiro Frio! Não é só de agora que a zona, tão fresca e bela, é considerada o sítio ideal para uma pausa durante uma jornada ao interior da ilha. Já assim era nos meados do século 19 como esta estampa bem demonstra. Representa uma clareira aprazível, localizada junto à escarpa rochosa, atravessada por um trilho que se estende, por entre árvores frondosas, acompanhando o ribeiro. Ao fundo os picos irregulares das serras recortam-se entre nuvens brancas, sob o céu azul de um dia ensolarado. Do lado esquerdo um grupo de homens protegidos por chapéus de aba larga, faz a sua refeição. No chão, recostados ou sentados nas pedras, entre brindes e comida, parecem caçadores sem pressa. Ao contrário de um deles que, já erguido, prepara arma, enquanto outros dois de espingarda a tiracolo, se afastam ao longe. Do lado oposto outro grupo aguarda, são os chamados “burriqueiros”, os homens ou rapazes que tomam conta das montadas e que, em pé ou deitados sobre o tapete de erva verdejante, aproveitam para descansar. Distinguem-se pelas botas e pelas típicas carapuças, normalmente eram contratados quando se alugavam os cavalos e faziam todo o percurso a pé, guiando o caminho, acompanhando a passada dos corcéis, sempre sem parar nem fraquejar. Eram homens rijos, cuja resistência surpreendia aqueles que nos visitavam. Os “burriqueiros”, com seus animais, distribuíam-se por diferentes pontos da cidade aguardando serviço, uma vez contratados os cavalos ou mulas eram prontamente arreados e os preços estabelecidos de acordo com a distância da viagem proposta.

Esta estampa e outras duas de assuntos madeirenses, um “Portrait af en Forer” (retrato de um carregador) e “Prospect Mellen Rio of St. Anna” (Incursão ao Ribeiro Frio e Santana), integram a publicação ilustrada “Corvetten Galatheas Jordomseiling”, que relata a primeira expedição científica dinamarquesa, de circum-navegação à escala global, realizada a bordo da corveta Galathea e que decorreu entre os anos de 1845 e 1847. A rota partia de Copenhaga, contornava o Cabo da Boa Esperança em direção à Índia, continuava pelo Sudoeste Asiático, ilhas do Pacífico, América do Sul, regressando através do Atlântico. Expedições navais e científicas semelhantes foram organizadas por vários países europeus, ficando célebre a do brigue a inglês HMS Beagle, que durou cinco anos, de 1831 a 1836 e na qual participou Charles Darwin.

Apadrinhada pela casa real da Dinamarca, a expedição Galathea tinha interesses científicos, de estudo e investigação, mas também diplomáticos e mercantis, designadamente estreitar de relações e assegurar acordos com nações longínquas, como a China. Sob o Comando do Capitão Steen Bille, levava a bordo uma vasta lista de passageiros, entre os quais zoólogos, botânicos, geógrafos, nomeados pela Academia Real das Ciências e alguns artistas, cuja missão era retratar plantas, animais e objetos, assim como pintar paisagens, ambientes e povos de onde passassem. O mais importante foi Johan Christian Thornam (Copenhaga, 1822 - Copenhaga, 1908) artista e naturalista, autor do próprio livro e dos 30 desenhos que o ilustram, relativos à América do Sul, Havai e Extremo Oriente, e logicamente os três da Madeira, local da primeira escala da expedição e onde se realizaram algumas incursões exploratórias a exemplo do que se observa nesta estampa. As litografias foram passadas à pedra por Johan Adolph Kittendorff (Copenhaga, 1820 - Copenhaga, 1902), cuja empresa I. W. A Tegner & Kittendorff se encarregou da impressão e o livro, editado por C. W. Stincks, foi publicado em Copenhaga, no ano de 1852.

Os verdes chamativos desta litografia, tal como as restantes cores, poderiam ter sido pintados de origem, pois sabe-se que esta edição incluiu um número muito limitado de exemplares com estampas aguareladas; mas também podiam ter sido coloridos posteriormente, em data desconhecida, caso pertençam ao lote maior impresso simplesmente a preto.

quinta-feira, 20 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde

 

Azulejos hispano-mouriscos

Barro vidrado, aresta

Sevilha, Espanha, séc. 16


Quem não se perde de amores neste labirinto de laçarias que se entrecruzam separando as cores? Os padrões geométricos são dos temas principais da Arte Islâmica, mais virada para o significado e a essência das coisas do que para a sua mera representação. Assim, a geometria reflete a linguagem do universo na medida em que expressa a grandeza da criação. O círculo não tem fim e por isso é infinito, é a base de todo o padrão geométrico. O círculo tem o significado religioso de unidade, um só Deus. É a partir dele e das suas múltiplas divisões que, a régua e compasso, se cria a grelha ilimitada de polígonos, estrelas e rosáceas. É esta complexa teia que permite a repetição sem fim, reflete a essência também infinita de Alá. Simultaneamente comprova a importância do pormenor ou do que é pequeno, porque na essência está o todo, ou seja, com um único módulo é possível partir para infinito.

Estes azulejos demonstram bem o perfeito domínio da construção geométrica. O padrão, de efeito caleidoscópico, parte de uma estrela verde, de 16 pontas, para irradiar numa intrincada grelha de laçarias brancas, cujo interior de diferentes formas poligonais é pintado nas cores manganês, mel e verde. A decoração segue a tradição das composições alicatadas que conheceram o seu apogeu nos séculos 14 e 15, primeiro em Granada e depois em Sevilha. São realizados na técnica de aresta, cujos primeiros testemunhos provenientes das oficinas cerâmicas de Sevilha e de Toledo, são atribuídos ao último quartel do século XV.

Na técnica de aresta a decoração era passada pressionando um molde, provavelmente de madeira, sobre os azulejos ainda crus. O molde tinha os motivos incisos e deixava uma aresta saliente com o contorno do desenho; daí a designação de aresta. Seguia-se uma primeira cozedura e depois os alvéolos da chacota eram preenchidos com vidrados de zarcão corados com óxidos, de cobre para o verde, de ferro para o mel e de manganês para o tom de castanho mais escuro. Eram precisamente as arestas que impediam a mistura dos vidrados durante a cozedura. Esta técnica inovadora representou uma grande evolução em relação à anterior de corda seca, simplificando ou quase mecanizando o processo de fabrico, o que permitiu uma produção massiva que veio responder à crescente procura do mercado interno e de exportação.

Portugal começa a importar azulejos sevilhanos ainda no século XV, mas é sobretudo a partir de 1498, após a visita de D. Manuel I a Castela e com estreitamento das relações com o país vizinho, que se difunde o gosto pela arte mudéjar em Portugal. Através das inúmeras obras implementadas por aquele monarca, esta moda que se reflete nos revestimentos cerâmicos e de madeira, nomeadamente nos tetos, difundiu-se por igrejas, conventos e palácios, espalhados por todo o país.

A Madeira, nos inícios de Quinhentos, viveu uma situação particularmente próspera, de acumulação de riqueza resultante da produção e comércio do açúcar. Foi um período de crescimento, que beneficiou do papel impulsionador de D. Manuel, preocupado em dotar o Funchal, elevada a cidade em 1508, de um centro mais desenvolvido, com edifícios mais adequados à importância mercantil alcançada. É este monarca que, em 1514, determina o revestimento a azulejos do coruchéu da Sé e é naturalmente por sua influência que se encomendam, em Sevilha, os azulejos que se aplicaram em diversos edifícios na Ilha, nomeadamente no Convento de Santa Clara, donde provêm estes exemplares, ou no desaparecido Convento de Nossa Senhora da Piedade, em Santa Cruz. À época o porto de Sevilha era particularmente ativo, sendo o único de Castela autorizado a comerciar com a América, pelo que os azulejos aí embarcados constituíam uma carga ideal e compensadora, serviam de lastro aos navios que no retorno podiam ser carregados com o precioso açúcar de exportação.

terça-feira, 18 de maio de 2021

DIA INTERNACIONAL DOS MUSEUS - 2021


 Exposição online que evoca a memória do Dr. Frederico de Freitas, as pessoas que lhe são próximas, as vivências da casa e a origem da coleção. Marca o início do projeto “Arquivo de Memória Dr. Frederico de Freitas”. Clique e descubra 

https://www.calameo.com/read/002808057660235d3682a

segunda-feira, 17 de maio de 2021

Amanhã é o Dia Internacional dos Museus. Visite-nos



 

CORES QUE FAZEM SENTIDO - verde

 

VERDE é a cor que significa liberdade, saúde e vitalidade. Simboliza a natureza e a juventude. Do latim viridis, a palavra “verde” estava associada à “planta que cresce”, que não atingiu o pleno desenvolvimento, que não é ou não está maduro, com pouca experiência de vida. Já o “meter o pé em ramo verde”, indica entrar em domínio pouco seguro, desconhecido. Por outro lado, a expressão “Ah! Mas são verdes”, indica alguém que desdenha algo que não pode obter. O verde é a cor complementar do vermelho e resulta da junção do pigmento amarelo e do azul, é tida como calmante, associada ao descanso e ao equilíbrio.

Notoriamente tóxico e quimicamente instável, o verde demorou a conquistar o mundo ocidental, mas não o Islão que com ele se identifica. Ausente das pinturas no Neolítico e remetido a um papel discreto na Antiguidade, o verde foi durante os séculos seguintes associado a tudo o que é volúvel e dúbio, desde a infância, à fortuna e infortúnio, à ventura e desventura, mas sobretudo ao destino. Assim era uma cor nem sempre usada nas roupas e nas joias, mas que há muito prevalece nos panos que forravam as mesas dos jogos de fortuna ou de azar.

O verde é uma das cinco cores litúrgicas usada nos paramentos da Igreja, é o emblema de vida e de esperança e por isso é a cor mais frequente, destinada aos dias comuns e a todos os domingos que não tenham celebrações associados e, por isso, sem cor própria.

Apenas na época romântica se tornou definitivamente a cor da natureza, o que lhe permitiu conquistar um lugar privilegiado na paleta de cores do Ocidente. É sem dúvida a cor do dinheiro. Atualmente a cor verde está associada à saúde presente na sinalética das farmácias, aos movimentos ecológicos e de preservação do meio ambiente. No trânsito, temos a “via verde” e o semáforo, que indicam para seguir em frente.

Na Casa-Museu Frederico de Freitas o verde são as cúpulas, os tapa-sóis, as ferragens das varandas, os bancos, as avencas do tanque e o portão da entrada, num convite a quem passa, um sinal claro para avançar e visitar.

domingo, 16 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo

 

Garrafa de licor

Faiança

França, Sarreguemines, 1908

Quanto custa levantar uma pera AMARELA? Será que o amarelo apetecível da pera madura tem um valor acrescido? O melhor é perguntar ao fininho que há anos tenta e não consegue erguer, nem um milímetro. Esta garrafa, ou jarro, servia para o licor, provavelmente de pera.

É um modelo antropomórfico e representa um homem muito magro, tentando erguer uma pera. O volume do fruto é desproporcional à figura, a qual se mostra de queixo apoiado, pernas fletidas e braços esticados envolvendo a pera. O corpo arqueado forma a asa e o chapéu cinzento o gargalo. 

Realizada em cerâmica, designada majólica, este termo está associado à faiança italiana do século 15, revestida de vidrado estanífero pintado a cru e posteriormente coberto por um denso vidrado transparente de óxido de chumbo mas, a partir do século 19, é também utilizado para designar os objetos, sobretudo decorativos, de faiança fina, revestidos com espessos e luzidios esmaltes estaníferos coloridos, de aparência muito semelhante aos antigos. A majólica é desenvolvida, nos meados do século 19, nas oficinas de Staffordshire e especialmente em Minton, que produziu vistosos e belíssimos exemplares de cerâmica moldada. Introduzida em Sarreguemines por Paul Geiger, em 1870, tornou-se uma das suas mais icónicas produções, contribuindo para o seu prestígio dentro e fora de portas. Também em Portugal nesta mesma altura as peças de majólica das Caldas da Rainha atingiram grande popularidade, especialmente as do nosso imbatível Rafael Bordalo Pinheiro cuja criatividade, irreverência e humor, se enquadram num gosto muito próximo ao deste exemplar, datado de 1908. 

A fábrica de cerâmica Sarreguemines, situada na localidade do mesmo nome, na Lorena, em França, junto à fronteira alemã, foi fundada, em 1790, pelos irmãos Nicolas e Augustin  Jacoby e por Joseph Fabry.  A partir de 1799 Paul Utzschneider, alemão, natural da Baviera, entra na sociedade adquirindo as quotas dos irmãos Jacoby. Para a fábrica é o início de um período de grande desenvolvimento e modernização, em que se adotam novas pastas e técnicas, e o processo acaba favorecido pelo bloqueio de Inglaterra que era então a principal fornecedora de cerâmica europeia e pelas encomendas de Napoleão Bonaparte I, que ajudam a impulsionar as vendas. Ao longo do século 19, sob a direção de Alexandre Geiger, genro e conterrâneo de Utzschneidede, e depois do seu filho Paul Geiger, acelera-se o processo de industrialização e de expansão da fábrica, que se converte numa das principais produtoras francesas de loiça utilitária, decorativa e azulejos. Após o conflito franco-prussiano, em 1871, a zona da fábrica fica afeta ao lado alemão e, com o intuito de manter o mercado francês e de evitar as taxas aduaneiras, são construídas duas sucursais em França, em Digoin em 1877 e em Vitry-le-François, em 1871. No início do século 20 consagra-se como uma das principais fornecedoras de cerâmica da Europa, especializada em serviços de mesa, peças decorativas, loiças sanitárias, de higiene e de cerâmica de revestimento, para fogões de sala e paredes. Em 1920 Sarreguemines e as suas filiais voltam a unir-se sob a direção de Edouard Casal, mas em 1940, os alemães ocupam de novo a Lorena e a sua gestão é confiada Luitwin von Boch, ligado à firma alemã Villeroy et Boch. O pós-guerra é difícil, com grande parte do complexo industrial destruído pelos bombardeamentos, Sarreguemines mantém-se em laboração sob a direção da família Cazal, até 1978. Nos anos seguintes é adquirida por diferentes grupos continuando uma marca destacada entre as principais fabricantes francesas, mas a partir de 1982 limita a sua produção à cerâmica de revestimento, nomeadamente aos azulejos, acabando por fechar definitivamente em 2007. 


sábado, 15 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo

 

Caneca

Barro vidrado

Rosa Ramalho (Galegos, 1888- Galegos,1977)

Barcelos, Portugal, séc. 20


De forma inesperada e da cor do trigo maduro, AMARELO quente e luminoso, esta caneca antropomórfica é claramente um objeto decorativo. Tem formato cilíndrico e asa de perfil em C. Apresenta um rosto masculino, com bigode, barbicha, nariz e orelhas salientes e a assinatura “RR” bem visível, incisa, junto à base. Estas iniciais identificam a autora, Rosa Barbosa Lopes, mais conhecida por Rosa Ramalho ou “Ramalha”. Nascida na freguesia de Santa Maria de Galegos, em Barcelos, a 14 de agosto de 1888, era filha de uma tecedeira e de um sapateiro, cuja alcunha “Ramalho” herdou. Aprendeu a fazer figurado de barro ainda menina, em casa de uma vizinha, mas torna-se moleira aos 18 anos, adotando a atividade do marido, António Mota. Só 50 anos volvidos, já viúva e com os filhos criados, regressa ao figurado de barro. Atividade tendencialmente feminina, uma vez que só os homens se sentavam na roda de oleiro para fabricar objetos utilitários. Nessa altura o figurado ou bonecagem, era moldado a partir de sobras das olarias e estava vulgarmente associado a apitos ou a paliteiros. 

As suas primeiras peças são em barro não vidrado, pintado com tintas não cerâmicas, nas cores vermelho, verde e azul, ou simplesmente, sem qualquer pintura. Depois trabalha o barro vidrado a uma só cor, usa sobretudo o castanho mel, mas também o verde e o amarelo, como neste caso. Eram usados os vidrados de chumbo coloridos com óxidos, de ferro para obter as cores amarela e castanho-melada, e de cobre para o verde. 

Inspirada nas histórias ouvidas em criança, cria um mundo de figuras diabólicas, com diabos para todos os gostos, seres fantásticos ou imaginários, onde abundam sereias, bichos-homens e medusas. Apresenta também a sua visão terrena, retratando personagens populares nas suas lides quotidianas, como músicos, carros de bois, matança do porco e diversos animais, cabras, porcos, lagartos, sardões, pombas, galos e galinhas. Aventura-se mesmo na representação sacra de temas da vida de Cristo, da Virgem e dos Santos. Vende o seu figurado nas feiras e nas festas populares e o seu trabalho chama a atenção. Se bem que inspirado nas raízes ancestrais da tradição oleira dos bonequeiros de Barcelos, mostra rasgos de originalidade e de criatividade nunca vistos.  

Será o pintor António Quadros, atento à sua produção, o primeiro a divulgá-la na Escola Superior de Belas Artes, do Porto, onde lecionava, e através de uma exposição coletiva na Galeria Alvarez, também no Porto, em 1956. A partir de 1958 Rosa Ramalho, analfabeta, começa a usar o monograma RR para identificar as suas peças, no início marcado com um carimbo e depois, quando domina o traço, riscado no barro. A personalidade muito viva, comunicativa e direta da artesã cativou os seus apreciadores das mais diversas áreas, políticos, intelectuais e artistas, promovendo a sua notoriedade. E a sua casa estava aberta a todos os que queriam testemunhar a sua criatividade. Tornou-se um símbolo acarinhado pelo Antigo Regime que valorizava as manifestações de Arte Popular como formas de propaganda e de construção de uma identidade nacional, que se pretendia idealizada e pitoresca. Foi premiada, agraciada e o interesse pela sua obra mantém-se muito além da sua morte, aos 89 anos, a 24 de setembro de 1977.  


quinta-feira, 13 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo

 

São Pedro

Madeira policromada e dourada

Portugal, século 17


São Pedro, esculpido em madeira policromada e dourada, é representado de pé e em posição frontal. Veste túnica comprida, com gola e cinto cingido na cintura, pintada de azul com motivos florais delineados também a azul, mas num tom mais escuro e avivados a dourado. Envolve-o um amplo manto amarelo, forrado a verde, lançado sobre o ombro e descendo na diagonal em pregas acentuadas e apanhadas sob o braço. Saído de uma oficina portuguesa, do século 17, a sua figuração é a tradicional, aparentando alguma idade, com a cabeça parcialmente calva, cabelos e barba curtos e nas mãos exibe os seus atributos, o livro fechado e a chave.

Pedro, outrora Simão, era pescador e foi com o seu irmão André, dos primeiros Apóstolos seguidores de Jesus a responderem ao chamamento para se converterem em “pescadores de homens”, numa clara alusão à missão evangelizadora que iriam assumir e que o livro, símbolo da Nova Lei ou dos Novos Ensinamentos, representa. Jesus chamou-o Pedro, “Kèpha” palavra hebraica que significa pedra, tornando-o a pedra fundadora da Igreja e confiando-lhe as chaves do Céu. Daí que a chave que exibe na sua mão direita, seja um dos seus atributos mais frequentes e facilmente reconhecíveis. Pedro goza de alguma primazia entre os apóstolos, é um dos discípulos mais próximos de Cristo e acompanha-O em numerosos episódios da Sua vida, mostrando uma faceta bem humana: incrédulo quando instado a caminhar sobre as águas em sinal de fé; intransigente quanto se nega a que o Mestre lhe lave os pés, impulsivo quando corta a orelha a um dos soldados que vem prender Cristo, e depois fraquejando, amedrontado, quando por três vezes nega conhecê-Lo. Esta atitude, de que se arrepende amarga e profundamente, é o motivo porque geralmente surge representado com vestes, ou manto, amarelo, cor associada à mentira, à deslealdade e, portanto, à traição. O apostolado de São Pedro desenvolve-se na Palestina e na Ásia Menor, em Jerusalém é preso por Herodes sendo libertado por um anjo. Parte então para Roma, onde organiza a Igreja romana, acabando martirizado durante as perseguições de Nero. A sua morte ocorre no mesmo dia da de São Paulo e por isso os dois surgem muitas vezes associados. 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo

 

Anjo Custódio

Círculo de Domenico Zampieri, Il Domenichino (Bolonha, 1581-Nápoles, 1641)

Óleo sobre cobre

Itália, séc. 17 (dp. 1614)


Pintura que representa um anjo que protege a criança do demónio, agachado à espreita. O anjo aponta os céus e empunha o escudo defendendo o menino que, de mãos postas e olhar fixo no alto, reza. À esquerda ergue-se um imponente túmulo de pedra trabalhada e num registo superior entre nuvens e querubins, sobre fundo luminoso, destaca-se a figura de Deus-Pai sentado, com Cristo e a Virgem à sua direita, um religioso ajoelhado à esquerda e o Espírito Santo, na forma de pomba de asas abertas, voando ao centro. 

Tudo assume um simbolismo especial, a figura dominadora e protetora do anjo. Seguro de si e belo, de feições delicadas, tez pálida, finos caracóis loiros, amplas asas coloridas e roupagens esvoaçantes. A criança pequena, tão frágil como uma alma e o demónio, o perigo sempre latente, assustador, armado, escuro, feio, de fisionomia vincada, cornos na cabeça e garras nos pés. Ao longe a paisagem terrena, ampla, montanhosa, arborizada e, no lado oposto, a sepultura, como um marco de que nada é eterno e que a vida tem um fim. No alto está a solução e o anjo indica o caminho para a santidade, iluminado pela graça do Espírito Santo e recompensado pela presença junto a Deus, a par de Cristo e sua Mãe.   

Este pequeno óleo sobre cobre, reproduz uma pintura de grande formato, realizada em 1614, por Domenico Zampieri, mais conhecido por Il Domenichino. O trabalho original destinava-se ao altar da capela da família Vanni, da invocação do Anjo da Guarda, na Igreja de São Francisco de Assis, em Palermo. A encomenda por parte da família Vanni, em cujo brasão figura um cão, poderá explicar a representação daquele animal no túmulo de pedra. Posteriormente, em data anterior a 1708, a pintura sofreu um corte perdendo-se o registo superior onde figurava a Santíssima Trindade e, em 1792, foi oferecida a Ferdinando II, rei das Duas Sicílias, encontrando-se hoje no Museu de Capodimonte, em Nápoles. Será assim este exemplar da Casa-Museu Frederico de Freitas um precioso testemunho da pintura na sua versão completa.

A devoção ao Anjo da Guarda cujas raízes remontam ao Antigo Testamento e ao Anjo que acompanha Tobias, baseia-se na crença de que cada ser humano tem o seu anjo protetor.  Este culto, nascido em Espanha no século 16, torna-se particularmente popular, a partir de 1608, quando por intervenção do Papa Paulo V é estendido a toda a igreja católica.  

Domenichino é uma figura importante na pintura italiana do século 17. O seu percurso profissional, associado a Ludovico e Aníbal Carracci, desenvolve-se entre Bolonha, Roma e Nápoles, através de importantes encomendas papais e comissões privadas, abarcando vários géneros de pintura, religiosa, histórica, mitológica, retratos e paisagens, em suportes tão variados como tela e o cobre, mas também frescos em abóbadas, tetos, paredes. As suas composições eram belas, no sentido de serem agradáveis à vista, seguia os ideais clássicos, retratando figuras humanas idealizadas, de emoções contidas, com poses e gestos calculados de forma a criar equilíbrio e harmonia. Preocupava-se com o aspeto formal e didático das suas pinturas, especialmente as de temática religiosa que deveriam expressar verdades fundamentais da igreja católica, perfeitamente assimiláveis, suscitando sentimentos de devoção e fé a quem as observava. Usou particularmente a pintura sobre cobre, tradicionalmente de pequenas dimensões, mas que permitia um grande detalhe pictórico, conseguido através de sucessivas e finas camadas de tinta aplicadas com cuidado. A rigidez e a impermeabilidade do suporte facilitavam a minúcia do trabalho e as cores, porque não eram absorvidas, mantinham-se saturadas e particularmente vibrantes. Dominava uma paleta de cores suaves, mas luminosas, o que se denota nesta representação, onde o amarelo é a cor que escolhe para brilhar, concentrando a luz nos principais pontos de atenção, nas vestes do anjo e na visão celestial.


CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo


 Azulejo italo-flamengo

Majólica

Oficina Den Salm, Antuérpia

Bélgica, 1558


Azulejo policromo nas cores amarelo limão, amarelo ocre, laranja, azul-cobalto, azul claro, verde, manganês e branco. Apresenta fundo amarelo com desenhos delicadamente delineados a azul-cobalto. À esquerda arruma-se uma secção de panóplia militar (escudo, bainha, lança e alabarda), donde parte uma fita amarelo ocre, rematada por borla pendente. No canto inferior direito um pássaro, de longo bico, pousado sobre haste branca com fita pendurada e, ao lado, uma borboleta esvoaçante.

Este é precisamente um exemplo onde o amarelo é sinónimo de ouro e de luxo. No século 16 os azulejos eram utilizados para dignificar igrejas, capelas, conventos, enobrecer palácios, revestindo espaços de habitação e “grottos”, isto é, pequenos nichos ou recantos dispersos pelos jardins. A sua aplicação era claramente um sinal de distinção e, naturalmente, quanto mais longínqua a origem e requintada a decoração, maior o prestígio de quem encomendava. Este azulejo provém do Paço Ducal de Vila Viçosa e integrava uma das encomendas a Antuérpia, feitas cerca de 1558, por D. Teodósio I, 5º Duque de Bragança, destinadas ao revestimento de recintos afetos aos seus aposentos e aos da sua segunda mulher, D. Brites. Nesses espaços de ostentação, estava associado um sumptuoso programa decorativo que envolvia para além de azulejos, pinturas murais ou de teto douradas, tapeçarias, tapetes, panos de armar e mobiliário diverso.

Muitos destes artigos eram adquiridos em Antuérpia, ao tempo importantíssimo entreposto comercial e uma das mais ricas cidades da Europa. A sua prosperidade refletia-se no desenvolvimento artístico e na produção de artigos luxo, como tecidos, tapeçarias, objetos em metais preciosos, pinturas, cerâmica e azulejos. Era, portanto, o centro onde se podiam adquirir os melhores produtos para as mais faustosas casas europeias. Não seria assim de estranhar que o Duque de Bragança, requintado, culto, conhecedor e apreciador das artes, encomendasse à oficina Den Salm, a melhor de Antuérpia, estes azulejos sem paralelo em Portugal. Dando prova do mais avançado gosto renascentista os diferentes painéis seguiam um complexo e muito cuidado esquema decorativo, adequado aos espaços a que se destinavam e que incluía cartelas com o brasão do encomendador, cenas do Antigo Testamento, heróis da Antiguidade clássica, enquadradas por ferronneries, puttis, panóplias militares e musicais, pássaros, insetos, símios, urnas, festões, flores e frutos variados. Nesta nova estética em que as cores ganham uma importante dimensão, também as gravuras que circulavam por toda a Europa são fonte de inspiração.

Estes azulejos, não sendo os mais antigos revestimentos de majólica aplicados em Portugal são, dos primeiros testemunhos, os que apresentam um programa mais extenso e inovador, introduzindo na decoração cerâmica as ferronneries e os fundos amarelos. O seu custo, conhecido através do Inventário realizado por morte de D. Teodósio, após 1563, também não tinha comparação, sendo vinte vezes mais caro do que os azulejos lisos de fabrico nacional e oito vezes superior aos encomendados em Sevilha, sem dúvida que se tratavam de imponentes revestimentos de aparato.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

de regresso às CORES QUE FAZEM SENTIDO - amarelo

 

“Que seria do AMARELO se não fosse o mau gosto?” De facto, a palavra amarelo deriva do latim amarellus, de amãrus, amargo. É a cor do limão, da bílis, do enjoo, daquele que tem “má cor”, do “riso amarelo” ou do que acaba por “amarelar”. Talvez por isso o amarelo esteja ligado à medicina, à caridade, aos que devem curar os doentes. Está também associada à mentira e à inveja, ao ciúme e à traição e, por vezes no reino animal, ao perigo. Foi ainda a cor dos excluídos, dos reprovados e da estrela imposta aos judeus.

Mas, nem tudo está perdido! Também é a cor primária mais luminosa que se situa no espectro da luz solar entre o verde e o laranja. É a cor do sol, da energia, de flores e frutos, da prosperidade e da riqueza, aquela que as crianças usam para transmitir a ideia de luz. O amarelo está associado ao ouro na heráldica e também na liturgia, mostra a omnipotência, a riqueza, só podendo ser usado nas festas solenes em substituição do branco e do vermelho.

Por norma é a cor por excelência para os “Táxis” e para as “Páginas Amarelas”, já para os ciclistas é a cor mais disputada, a da camisola amarela do vencedor da Volta a França, associada ao jornal L’ Auto patrocinador da competição. Na China e na Rússia, é a cor dos imperadores, dos ricos e poderosos.

Cor cheia de contradições e instabilidade, junta-se-lhe um pouco de vermelho e ela transforma-se em laranja, um pouco de azul e temos o verde.

Na Casa-Museu Frederico de Freitas é a cor de um dos seus espaços, a Sala Amarela assim batizada por ser esse o tom que predomina nos cortinados, nos estofos e, na sua versão mais brilhante, nos detalhes dourados que animam o mobiliário.

sexta-feira, 7 de maio de 2021

Azulejos “gafanhotos e espiga”


Padrão de azulejos "gafanhoto e espiga" da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro. Este padrão foi criado em 1902 para a “Panificação Mecânica, Lda.”, de Campo de Ourique, em Lisboa, altura em que Bordalo Pinheiro concebe outros tipos de padrões para casas comerciais. Estes azulejos realizados em relevo, estão pintados nas cores verde e mel, apresentam gafanhotos dispostos na diagonal sobre duas espigas de trigo e finas folhas ondeantes sobre fundo verde mais claro. Os dois azulejos superiores estão colocados em espelho, tal como estariam no padrão original que estava associado a uma cercadura com idênticos motivos.

Rafael Augusto Prostes Bordalo Pinheiro nasceu em Lisboa a 21 de março de 1846, foi aguarelista, ilustrador, decorador, caricaturista político, jornalista, ceramista e professor. Frequentou o Conservatório e a Academia de Belas Artes, o Curso Superior de Letras e a Escola de Arte Dramática. Em 1863 entra para a Câmara dos Pares, onde descobriu a sua verdadeira vocação para as intrigas políticas. Em 1879 concebe a figura do Zé Povinho, publicada n'A Lanterna Mágica. Na Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha começa, em 1885, a produção de louça artística. Concebeu um núcleo variadíssimo de peças, como jarras, vasos, bilhas, jarrões, pratos, azulejos, painéis, frisos, placas decorativas, floreiras, fontes-lavatório, centros de mesa, bustos, molduras, caixas, alfinetes e perfumadores. Produziu imensos desenhos para almanaques, anúncios e revistas estrangeiras. Foi prestigiado com várias medalhas de ouro, lançou várias publicações, entre elas, "O Calcanhar de Aquiles", "A Berlinda" e "O Binóculo, sendo a "A Paródia", o seu último jornal. Rafael Bordalo Pinheiro faleceu, em Lisboa, a 23 de janeiro de 1905. A fábrica continua em atividade, com o nome de Bordalo Pinheiro criando louças de mesa e fazendo reproduções de peças antigas.

A Casa-Museu Frederico de Freitas tem no seu acervo outro azulejo e peças em louça deste autor, ou da Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha.


Azulejos “gafanhotos e espiga”

Faiança, relevo

Rafael Bordalo Pinheiro

Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha, Portugal, 1900-1905


quinta-feira, 6 de maio de 2021

O QUE É O AZULEJO?


 Azulejo é barro, é vidrado, é quadrado. É terra, é fogo, é lógica. É um revestimento que conserva e embeleza. Por vezes é discreto e nem se nota, outras é imponente, comovente até às lágrimas. Por isso o azulejo é mágico. 

É uma estranha parcela de um todo. Isolado representa pouco, mas multiplicado e enquadrado, cresce, integra-se, completa-se, ganhando sentido num revestimento que pode ser humilde ou majestoso. E o curioso é que por maior que seja a área azulejada, a falta da mais ínfima parcela, equivalente a um azulejo, torna-se uma lacuna que ressalta e compromete o conjunto. Por isso cada azulejo é importante.

É esforço, tempo e dedicação. É a manipulação de materiais modestos para um resultado deslumbrante. É o fado de gerações de pintores, oleiros e ladrilhadores que enriquece arquiteturas. Por isso azulejo é fortuna. 

É um saber antigo, orgulho, tradição, renovação. É a capacidade de renascer e sobretudo um reinventar que o tornou tão nosso. Por isso azulejo é dinâmica. 

É arte e imaginação. É a expressão de um país, a imagem cintilante que há muito nos marca a alma e que tão bem reconhecemos por sermos tão semelhantes. É sobretudo azul, com um sem fim de cambiantes… como o nosso mar… como o nosso céu… mas não só. Também não somos só mar e céu… Por tudo isso azulejo é Portugal.

Ana Margarida Araújo Camacho

In “AZULEJO - O Que é”. Rosário Salema de Carvalho (coord). Centro Atlântico, 2018



Legenda da imagem:
Azulejos de cercadura
Faiança
Portugal, séc. 17 (2ª metade)

AZULEJANDO - Dia Nacional do Azulejo 2021


 O Dia Nacional do Azulejo comemora-se a 6 de maio, constituindo uma chamada de atenção para a importância do azulejo português, mas também para a necessidade imperiosa da sua salvaguarda. 

Há mais de 5 séculos que o azulejo faz parte da nossa história e a sua presença tornou-se tão banal que nem sempre nos damos conta de como é marcante nas nossas vidas. Habituamo-nos aos revestimentos cerâmicos nas capelas, igrejas, no interior de edifícios, em fachadas, torres, varandas, jardins e fontanários e temo-los como garantidos. No entanto é importante ter a noção da sua diversidade. O azulejo não é uma realidade única, mas a soma das muitas realidades em que foi capaz de se reinventar ao longo dos tempos. Perceber essa evolução é acompanhar a história da arte portuguesa através de um imenso património, tão rico quanto frágil. O desenvolvimento urbano, as demolições e remodelações dos edifícios, os roubos, bem como o vandalismo, são os maiores riscos que afetam os revestimentos que se mantêm in situ. 

A Casa-Museu Frederico de Freitas possui uma diversificada e importante coleção de azulejos, alguns são testemunhos únicos de revestimentos desaparecidos e representam contributos fundamentais para o estudo da azulejaria nacional e da sua aplicação na Região. Foram salvos numa altura em que o azulejo era encarado como uma arte menor e em que o seu destino após as demolições era o lixo. A Casa-Museu Frederico de Freitas associa-se a esta comemoração nacional, dedicando a semana ao projeto online “Azulejando”, que a cada dia divulgará um exemplar da coleção. No dia 6 de maio, as entradas serão gratuitas e estarão disponíveis duas visitas orientadas à Casa dos Azulejos, às 11h00 e às 14h30, para grupos até 10 participantes. 

O projeto culmina no sábado com a realização de um ateliê de introdução ao azulejo, dedicado aos mais novos, que se inicia às 10h00 e estará aberto a um máximo de 10 crianças. A participação é gratuita, mediante inscrição prévia, através dos Serviços Educativos da Casa-Museu Museu Frederico de Freitas.


segunda-feira, 3 de maio de 2021

Maio


 Maio, MAY., Francesco Bartolozzi (Florença, 1728 - Lisboa, 1815), gravura, século 18 (?).

domingo, 2 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - laranja

 

Casal de camponeses à porta de casa

Roberto Cunha (Calheta, 1901 - Funchal, 1966)

Barro  

Portugal, Madeira, 1948


Peça de barro cozido (terracota) que retrata um casal de camponeses, idosos, nos seus afazeres quotidianos. Apenas uma parcela da fachada da casa está representada, a parede de pedra aparelhada e a porta entreaberta. Na frente a anciã, de pé e com as mãos ocultas sob o avental, observa o homem, sentado à soleira, ocupado a moer o cereal. Não existe pose, o momento é captado com a naturalidade do dia a dia, como um registo onde o observador não interfere, nem é percebido. Nada atrapalha a descontração e a intimidade do casal, ele concentrado na sua tarefa e ela ligeiramente inclinada, espreitando o resultado, a farinha que cai no pano estendido no chão. 

Mas se a cena parece espontânea, o registo não o é. Nada escapa ao olhar arguto do artista que não se poupa nos detalhes, talvez preocupado em fixar uma ruralidade em vias de desaparecer. Não descura as características físicas e o traje de cada personagem, ela de cabelo repartido e preso atrás num carrapito, de blusa e saia sob o avental, e ele de barbas, barrete de orelhas na cabeça, camisa, calças compridas e descalço. À maneira de uma recolha etnográfica fixa o modo como o camponês aciona o moinho de mão, segurando o cabo com a mão direita, mantendo um punhado de cereal na esquerda, o pano para a recolher a farinha em baixo e o saco do grão próximo. Sempre atento aos pormenores, nem se esquece de incluir a panela de ferro e a caixa onde crescem plantas junto à entrada. 

O autor, Roberto Cunha, é um autodidata, com um dom artístico inato, em especial para trabalhar o barro, matéria que explora, tirando o máximo partido da sua plasticidade e cor.  Deste modo os seus melhores trabalhos não são pintados, nem precisam de o ser, porque a cor única foca a atenção e valoriza o detalhe. O tom quente, alaranjado e uniforme do barro cozido, realça o virtuosismo da modelação e da moldagem, as duas técnicas que utiliza nas suas esculturas. E virtuoso é de facto o adjetivo que melhor classifica o artista que se esmera em criar peças de tamanho reduzido, como esta que não ultrapassa os 12,5 cm, com um detalhe e rigor inesperados.

Roberto Luís Paiva e Cunha estudou no Funchal, na Escola Industrial António Augusto Aguiar, e teve aulas de desenho e pintura com Alfredo Bernes. Apesar de se ter iniciado como desenhador numa casa de bordados, os seus 40 anos de carreira profissional passaram-se na “The Western Telegraph Company Limited”, mais tarde integrada na “Cable and Wireless”, onde trabalhou como telegrafista e mecânico. Em 1929 foi um dos fundadores do Re-nhau-nhau, conhecido periódico trimensal humorista, sendo um dos seus principais caricaturistas. Assumiu ainda, por alguns anos, a direção artística da Olaria Funchalense e desde então a sua atenção virou-se para o barro, material em que revela um esmero e uma qualidade artística notáveis. Data da década de 30 o início da sua produção em figurado de barro. Nesse âmbito dedica-se especialmente à miniatura representando através dela tipos populares e costumes regionais. Floristas, bordadeiras, vendedores de botas, borracheiros, camponeses em lides quotidianas, a corça, os carreiros do Monte e de bois e até banhistas no Lido, são alguns dos seus trabalhos mais conhecidos que ainda hoje se mantêm dispersos na posse de familiares, de alguns privados, ou integrados em coleções públicas, como é este o caso da Casa-Museu Frederico de Freitas.


sábado, 1 de maio de 2021

CORES QUE FAZEM SENTIDO - laranja

 

Jarro com tampa 

Cobre e latão

Alemanha, WMF (Württembergische Metallwarenfabrik AG), ca. 1914


Jarro Arte Nova em cobre, de corpo hexagonal, mais largo na parte inferior e tampa do mesmo formato, com pega e asa de latão. Todas as faces são decoradas em baixo relevo, com o mesmo motivo vegetalista estilizado que se estreita e alonga no centro, para se desdobrar em elegantes linhas curvas entrelaçadas, em ambas as extremidades. A asa retoma as formas vegetalistas, esguias e ondulantes e é vazada, tal como a pega no topo da tampa, mais simples e arredondada. As linhas elegantes e sóbrias valorizam este modelo, cuja a matéria de um suave e belo tom alaranjado é um fator de beleza acrescentado.  

Foi produzido na fábrica alemã WMF (Württembergische Metallwarenfabrik) que na viragem do século 20 se torna uma das maiores exportadoras mundiais de artigos utilitários de mesa, em metal.  A fábrica teve a sua origem na empresa “The Straub & Schweizer” fundada em 1853, vocacionada para a reparação de objetos de metal, apesar de logo no ano seguinte apresentar os seus primeiros artigos na Feira Industrial de Munique. Após um período de contínuo crescimento, algumas aquisições, fusões e abertura de sucursais na Alemanha e no estrangeiro, em 1880 a então Strab & Son funde-se com a  fábrica de artigos de metal Ritter & Co, dando origem à WMF AG que ainda hoje se mantém em atividade. Esta empresa é especialmente afamada pelos seus artigos no estilo Jugendstil, versão alemã e austríaca do estilo Arte Nova, relativo ao período em que o escultor e designer Albert Mayer, foi seu diretor, entre os anos de 1884 e 1914.

A Arte Nova é um estilo eclético surgido na Europa, no início dos anos 90 do século 19, e que sobreviveu sensivelmente até à 1ª Grande Guerra. Assumiu características múltiplas e manteve especificidades próprias nos diferentes países do mundo ocidental, nomeadamente na França, Grã-Bretanha, Alemanha, Áustria, Itália, Espanha, Rússia e Estados Unidos. Atinge o seu auge na Grande Exposição Internacional de Paris, em 1900. Desenvolveu-se numa época de maior desafogo económico e de grandes mecenas, a chamada “Belle Epoque” que cultivou novos valores estéticos em diferentes campos artísticos, viabilizou e valorizou o design, o trabalho especializado, moroso e artesanal, não obstante o seu preço elevado. O passado, como fonte de inspiração, revela-se através da reinterpretação, estudo e aperfeiçoamento das técnicas ancestrais das civilizações islâmicas e orientais no trabalho dos diferentes materiais, através das artes do fogo, dos metais, vidro e cerâmica, ou das artes gráficas. A natureza torna-se uma verdadeira obsessão e os motivos vegetalistas, vivos e orgânicos, parecem emanar vida própria e, sem restrições, desafiam regras estabelecidas, crescendo em formas que se contorcem soltas e indomáveis, lançando belas linhas curvas repletas de movimento.